O jornal O Estado do Maranhão, de propriedade da família do ex-presidente José Sarney, incomodou-se com a aprovação de financiamento de uma pesquisa acadêmica sobre o comportamento editorial do jornal em relação ao governo de Flávio Dino (PCdoB). A pesquisa Governando contra as notícias: o primeiro ano do governo Flávio Dino nas páginas do jornal O Estado do Maranhão foi submetida a um edital da Fundação de Amparo à Pesquisa do Maranhão (Fapema) e, após avaliação por consultores externos, aprovada para financiamento. O resultado foi divulgado no último dia 15 de julho.
No dia seguinte, a coluna Estado Maior surpreendeu ao atacar a pesquisa, coordenada pela professora Li-Chang Shuen Cristina Silva Sousa em parceria com o diretor da Fundação Maurício Grabois, professor Fábio Palácio de Azevedo, e a professora Josefa Bentivi Andrade. A equipe de doutores responsável pela pesquisa compõe o corpo docente do Departamento de Comunicação da Universidade Federal do Maranhão.
Demonstrando claro desconhecimento da proposta da pesquisa e do funcionamento dos editais das agências de fomento, a coluna acusou a Fapema de aprovar um projeto por critérios políticos e afirmou que a intenção do governo é atacar o jornal e calar a liberdade de imprensa. “A pesquisa sinaliza críticas ao jornal e flores aos Leões”, afirmou O Estado do Maranhão em referência ao Palácio dos Leões, sede do governo estadual.
A coluna buscou, ainda, desqualificar a área de Ciências Sociais e Humanas ao estranhar um projeto “voltado especificamente para analisar a postura de um jornal frente ao atual governo”. O jornal afirmou ser “curioso figurar entre estudos para as áreas de saúde, ciências e tecnologia uma pesquisa que (pelo título) acena em direção a interesses do governo contra a imagem de um veículo de imprensa”. O que tentou o Estado do Maranhão, com esse ataque à liberdade de cátedra, foi lançar uma sombra de descrédito sobre uma equipe qualificada, com pesquisas ativas na área de mídia, política e poder.
A reação da comunidade acadêmica foi rápida. O departamento de Comunicação Social da Universidade Federal do Maranhão pediu direito de resposta, que foi acatado pelo jornal, e fez circular amplamente uma nota de repúdio na qual esclarece que pesquisadores não fazem militância política, e sim ciência. A Fundação de Amparo à Pesquisa do Maranhão também afirmou, por meio de nota, que o julgamento das propostas apresentadas ao edital foi feito por consultores externos, de outros estados, com a chancela de serem pesquisadores de produtividade do CNPQ e sem nenhum vínculo com quaisquer dos proponentes locais. A repercussão negativa para o jornal foi tão grande que no dia 17 de julho a coluna voltou ao assunto para publicar o direito de resposta e tentar se retratar, ao desejar “sorte” para os pesquisadores.
Pesquisa que incomoda
O projeto prevê o acompanhamento da cobertura do jornal sobre o primeiro ano do governador Flávio Dino, com uma comparação quantitativa e qualitativa da cobertura do mesmo jornal durante o último ano da governadora Roseana Sarney, uma das proprietárias de O Estado do Maranhão. Os pesquisadores partem do pressuposto de que o jornalismo é uma instituição política, e que os jornais atuam como atores institucionais na disputa por hegemonia que, no caso em exame, dá-se entre as elites maranhenses tradicionais e os novos atores políticos alçados ao poder estadual com a vitória de Flávio Dino nas eleições de 2014.
O principal objetivo da pesquisa é entender o comportamento editorial do jornal, que dá voz a um grupo político deslocado para a oposição após décadas no comando do estado. Um paper com os resultados preliminares já se encontra disponível e será apresentado no Rio de Janeiro em setembro, durante o 38º Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação. O trabalho será publicado em breve pelo portal Grabois.